domingo, 7 de junho de 2015

Crise da mídia tradicional e demissões na imprensa


Muito se tem falado que as empresas jornalísticas tradicionais estão passando por uma séria crise e a consequência é a demissão dos jornalistas. Mas a atual onda de demissões no setor é decorrência de uma série de fatores que devem ser avaliados para uma correta compreensão do fenômeno. A avaliação da conjuntura pela qual passa o mercado jornalístico é condição necessária para a elaboração de possíveis respostas aos problemas que se apresentam.
Inicialmente é preciso esclarecer que as empresas jornalísticas se pautam pelas mesmas taxas de lucratividade obtidas pelo capital financeiro pois os acionistas exigem este retorno, caso contrário, simplesmente aplicam seu capital em outros empreendimentos. Além do mais, o gerenciamento das empresas jornalísticas deixou de ser obra das famílias detentoras dos títulos e são feitos por administradores profissionais que cuidam preferencialmente da lucratividade, e não da informação jornalística.
A diminuição do investimento publicitário para veículos impressos e a pulverização das verbas restantes entre as várias mídias cria concorrência e tende a diminuir a margem de lucro individual. Atualmente a mídia digital é a que mais cresce e este setor é dominada por duas empresas estrangeiras, Google e Facebook, que, por sua vez, não tem ligação empresarial direta com nenhuma das famílias tradicionais que dominam a comunicação no Brasil. Portanto, o mercado publicitário passa por uma fase de ajuste onde um novo e importante ator se faz presente alterando o equilíbrio do mercado.
A economia mundial, que se encontra em uma fase de retração com recuperação lenta nos mercados desenvolvidos, traz reflexos negativos aos países em desenvolvimento, como é o caso brasileiro. Superdimensionada pelas empresas, a crise se torna um argumento a justificar as demissões.
Finalmente, é preciso salientar que a posição política ideológica das grandes empresas de comunicação, de oposição frontal ao governo federal, tem consequências econômicas, diretas e indiretas, pois o governo é um grande anunciante publicitário. Seja indiretamente pelo sentimento de inércia patrocinado na sociedade pela linha editorial que desencoraja o investimento produtivo ou diretamente pelo redirecionamento dos gastos públicos em outras mídias, a posição política empresarial influi na lucratividade.
Como resultado deste quadro as empresas passam a utilizar o recurso das demissões frequentes como ferramenta para controle de custos e equacionamento da lucratividade, deixando o bom jornalismo em segundo plano. Após as demissões, quando necessitam repor vagas, o quadro é recomposto com contratações onde os salários são inferiores aos dos demitidos.
Com estas constantes mudanças no quadro de jornalistas a organização sindical fica fragilizada, o que traz reflexos negativos na própria capacidade de mobilização e resistência da categoria. No interior das empresas a consequência é acúmulo de trabalho e o arrocho salarial. Com a insegurança constante em relação à manutenção dos empregos a Campanha Salarial perde em intensidade e os salários passam a ser ainda mais achatados, iniciando um círculo vicioso de perdas para a categoria.
A esta conjuntura econômica vem se somar duas questões políticas que “apimentam” ainda mais o debate. A primeira é a desoneração da folha de pagamento que não surtiu efeito sobre o nível de contratação pois não exigiu contrapartidas das empresas que a utilizaram apenas para abater custos e aumentar a lucratividade. Agora, com a revisão desta política, as empresas se veem na contingência de defender as vantagens obtidas e não pretendem aumentar o custo da folha de pagamento.
O segundo ponto a ser observado é a tradição de “Pjotização” do setor. O PL 4330 (que procura “regulamentar” a terceirização) é amplamente apoiado pelas empresas que entendem que sua aprovação é uma forma de pacificar o entendimento sobre esta questão evitando futuras ações jurídicas que, invariavelmente, reconhecem o vínculo empregatício dos jornalistas.
Por último, mas não menos importante, é o fato de que o setor é altamente concentrado em poucas empresas, enquanto o movimento sindical é pulverizado em categorias e dividido regionalmente. Esta realidade traz como consequência o superdimensionamento do poder empresarial em contrapartida ao enfraquecimento da força do trabalhador que encontra muita dificuldade para alterar esta realidade.
A resposta da categoria a este estado de coisas deve se dar no campo político e trabalhista. É preciso que os demitidos aumentem o custo das demissões imotivadas com ações jurídicas cobrando horas extras, que são reconhecidamente sonegadas aos jornalistas, e vínculo empregatício, no caso de PJ's e frilas fixos.
No campo político a categoria deve juntar forças com as centrais sindicais contra a aprovação do PL 4330, pela implantação da Convenção 158 da OIT, que impõe regras para as demissões, e na defesa comum dos direitos trabalhistas que estão sendo alvo de uma ofensiva conservadora no Legislativo onde as forças progressistas são minoritárias. Sempre que possível, as conquistas devem ser firmadas em acordos ou convenções coletivas.
Internamente, os Sindicatos de Jornalistas devem se organizar para que seus departamentos jurídicos possam demandar ações que se contraponham às demissões coletivas promovidas pelas empresas e exigir negociações prévias em caso de demissões em massa.
Finalmente, é importante organizar os jornalistas nos locais de trabalho. Quando a categoria está alerta e o processo de demissões é identificado previamente, a reação organizada por parte do Sindicato é mais eficiente do que quando realizada a posteriori.
Naturalmente, a superação desta onda de demissões requer ações na esfera econômica e política, envolvendo a sociedade civil e o poder público. Mas nada será conquistado sem a participação efetiva dos trabalhadores e de suas representações.
_________________________
Este texto é uma versão revista do publicado no jornal Unidade, órgão oficial do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de são Paulo, nº375, abril/maio de 2015, página 3.

Nenhum comentário:

Postar um comentário