quarta-feira, 11 de junho de 2014

Copa do Mundo e política


O governo divulgou estimativa de que espera 600 mil turistas estrangeiros nesta Copa e a pergunta é; o país está preparado para receber a todos? Se levarmos em conta as estatísticas de que dispomos não teremos grandes problemas. Grandes eventos no Brasil não são novidades, pelo contrário, eles se repetem anualmente com os percalços naturais trazido pela grandeza dos encontros.
A secretaria de Turismo do Rio de Janeiro informou que a cidade recebeu mais de 900 mil turistas somente no Carnaval de 2014 (cerca de 70% deles estrangeiros). Já a festa em Salvador, Bahia, segundo as autoridades locais, contou com um afluxo de 550 mil visitantes e, também dados oficiais, os blocos de Pernambuco levaram mais de um milhão de turistas às suas ruas. A cidade de São Paulo, que não é tida como um tradicional destino turístico, traz regularmente para a cidade uma multidão de visitantes: o Salão do Automóvel atrai 245 mil visitantes; a Bienal do Livro, 217 mil; a Parada Gay, 100 mil e a Formula 1, 68 mil. Além disso, a Associação Nacional de Aviação Civil – ANAC, revelou que, entre janeiro e abril de 2014 foram transportados 31,3 milhões de pessoas pelos céus do país.

Portanto, espalhar 600 mil pessoas em 12 diferentes cidades por cerca de 30 dias não parece ser uma tarefa muito difícil ou inédita. Se a estrutura existente já respondia a demanda, agora, com a abertura de novos hotéis, a reforma dos aeroportos, a construção dos estádios e outras benfeitorias realizadas (mesmo que não integralmente acabadas) devem, minimamente, resolver a situação sem maiores dramas.

Em relação ao custo da Copa, que esta causando grande polêmica, o portal da Transparência (http://www.portaltransparencia.gov.br/copa2014/home.seam) informa que está previsto gastos de 25,8 bilhões de reais. Este valor não envolve apenas o custo dos estádios mas também seis outras categorias de ações; desenvolvimento turístico, mobilidade urbana, segurança, telecomunicações, aeroportos e portos, totalizando 81 projetos. A verdade é que estas intervenções precisariam ser realizadas independentemente da Copa. Associar estas intervenções como um “legado da copa” é uma meia verdade.
Após um começo promissor, com manifestações populares pela conquista do direito de realizar a Copa e depois as Olimpíadas, o governo não soube capitalizar este sentimento e viu a oposição desconstruir ponto a ponto a simpatia popular. A estratégia atingiu seu ápice quando, após as manifestações de junho de 2013, conseguiu-se associar o desejo manifesto de melhorias sociais por parte da população a uma ideia de que os gastos com a realização da Copa desviariam recursos públicos das áreas sociais.
A comunicação foi tão inepta que, a esta altura do campeonato, não adiante dizer que os 12 estádios correspondem a cerca de 8 bilhões, 30% dos gastos, e que a maior parte vai para as intervenções de infra estrutura que beneficiam a população. Tampouco se convenceu a opinião pública que parte do dinheiro público para os estádios são originados de financiamentos feitos pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social que retornarão posteriormente aos cofres da instituição, tampouco que os valores gastos serão auditadas pelo Tribunal de Contas e, caso comprovados problemas de corrupção ou desvio de verbas, serão acionados os mecanismos legais.
Outra coisa que as autoridades não conseguiram demonstrar é o fato de que as construções movimentam, direta e indiretamente, o mercado de trabalho, principalmente o da construção civil, de uso intensivo de mão de obra. Sobre a movimentação financeira desta Copa, o Governo brasileiro calcula que os turistas deixarão 6,7 bilhões de reais no país (quase o gasto com os estádios), mas a imprensa só divulga o lucro da FIFA, “o maior da sua história” e não se fala sobre a influência no mercado consumidor local.
O problema foi reconhecido pelo próprio ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, que confessou em artigo na revista Teoria e Debate: “Por outro lado, é preciso reconhecer que nosso governo não fez adequadamente o debate com a sociedade sobre a Copa do Mundo. Essa autocrítica é importante para compreender por que perdemos a batalha da comunicação em torno do evento e possibilitamos que nossos adversários construíssem uma falsa imagem de que foi contaminado pela corrupção, com a construção de “elefantes brancos”, com a submissão do país à Fifa e com grandes prejuízos para o nosso povo” (edição 125, disponível na internet no endereço http://www.teoriaedebate.org.br/materias/sociedade/hora-da-copa?page=full ).
Também é inegável que o planejamento foi falho. “Cometemos erros básicos de gerenciamento”, disse Paulo Resende, coordenador do Núcleo de Infraestrutura e Logística da Fundação Dom Cabral, uma conhecida escola de negócios sediada em Minas Gerais (Planejamento falha, mas Copa traz ganhos. Valor Econômico, pág. B10 edição de 7. 8 e 9 de junho de 2014). Mas apesar destes problemas é fato que a realização da Copa no Brasil será um grande negócio. Os primeiros balanços estão demonstrando isto, conforme registra a matéria citada.
Além do mais, a relação entre futebol e política é bastante conturbada. Existe uma certa lenda de que quando a seleção brasileira vai bem o governo é favorecido. Durante a ditadura militar circulava entre a oposição uma frase que dizia: “onde a Arena vai mal, mais um time no Nacional”, sendo a Arena o partido de sustentação dos ditadores. Inegavelmente, os militares usaram o futebol. O Campeonato Nacional foi criado em 1971 substituindo os torneios que existiam então, novos estádios foram construídos e a situação chegou a tal ponto que em 1979 o Campeonato Nacional foi disputado por 94 equipes.
Por outro lado, para parte da esquerda, trata-se de evitar uma prática alienante, pois criticar o futebol é combater o “ópio do povo”.
 Para coroar este imbróglio a grande imprensa, que tem interesses econômicos no evento, mas mantém forte posição oposicionista em relação ao governo Dilma, manteve uma posição dúbia neste caso, não dando grande destaque às situações positivas mas divulgando os problemas que surgiram.
Por tudo isso, o que temos é uma torcida envergonhada. Pelo menos, esta foi uma das observações dos jornalistas esportivos presentes ao debate sobre a cobertura da Copa realizado no Sindicato dos Jornalistas realizado em 24 de maio, que observaram que o “clima de Copa” ainda não contaminou o público, mas, mesmo assim, concordam que durante os jogos esta situação deve mudar.

Em minha opinião o legado que esta Copa do Mundo deveria deixar seria no campo esportivo. O país do futebol, como uma nação subdesenvolvida clássica, exporta matéria prima e importa produto manufaturado. Vendemos jogadores e compramos o campeonato e o marketing esportivo das economias desenvolvidas. Assim, temos a ilusão de que lucramos com o futebol quando, na verdade, fornecemos condições para que os times europeus dominem o mercado da bola.

Infelizmente, parece que neste quesito não teremos “padrão Fifa” a deixar como legado. A administração do nosso futebol continuará arcaica, com clubes mal administrados e calendários de jogos absurdos. O que fica são os novos estádios. Para dizer a verdade, os velhos estavam caindo aos pedaços e precisavam de reformas pois não se fazia qualquer investimento sério nesta área desde os anos de 1970, quando a ditadura controlava os campeonatos.

Agora vamos aproveitar nossas modernas arenas multiusos para ser o campeão, campeão não, hexacampeão.

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